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Desabafos Agridoces

"Enfim, bonito e estranho, desconfio que bonito porque estranho"

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"Enfim, bonito e estranho, desconfio que bonito porque estranho"

A Abadia de Northanger: breves notas

Primeiro livro do desafio despachado, na verdade esta é a terceira vez que o leio. Eu bem disse que não era muito boa a levar desafios por diante...Catherine é uma personagem demasiado adorável para se resistir. E para uma obra com mais de duzentos anos, é interessante o quanto ela se parece com uma qualquer adolescente: Catherine não tem um temperamento muito aplicado nem é especialmente bonita ou talentosa; não sabe muito do mundo e a ideia de sair de casa e poder conhecer pessoas novas deixa-a entusiasmada - mas nem sempre é fácil saber o que fazer ou o que dizer.

Os seus julgamentos sobre o carácter daqueles que a rodeiam e sobre as situações são muitas vezes equivocados - não é tão confuso quando alguém diz uma coisa e depois faz outra? Tem de lidar com pessoas tóxicas que dizem ser suas amigas (as Isabellas são uma inevitabilidade desta vida) e que a levam a fazer coisas das quais mais tarde se arrepende. Tem uma obsessão por um tema em particular e alguém que lhe faz sentir borboletas na barriga.

Considerado uma sátira aos romances góticos, boa parte da hilaridade da história vem do contraste entre o que se espera de uma heroína e o quão prosaica é Catherine e o ambiente em que se move, em que as viagens decorrem sem incidentes, ninguém é trancado em quartos e os baús não contêm qualquer mistério.

É algo mais presente na segunda parte, mas achei interessante notar as subversões ao género que vão pontilhando a narrativa, mesmo antes de chegarmos à parte da abadia. Era esperado que uma heroína fosse um modelo perfeito de beleza e virtude e que fosse passiva, mas Catherine não sabe, por exemplo que "no young lady can be justified in falling in love before the gentleman’s love is declared, it must be very improper that a young lady should dream of a gentleman before the gentleman is first known to have dreamt of her". Em vez de ficar pálida e desmaiar quando vê Henry com outra mulher ao lado (ou sair a correr como está sempre a suceder nas telenovelas) ela assume que deve ser a irmã e "(...) instead of turning of a deathlike paleness and falling in a fit on Mrs. Allen’s bosom, Catherine sat erect, in the perfect use of her senses."

No entanto acabei por achar que classificar o livro como apenas uma sátira é um bocado superficial -  para Jane conseguir citar tantos detalhes de novelas góticas é porque as deve ter lido. Faz pensar o quanto Catherine Morland é um reflexo da própria Austen, uma leitora voraz com uma imaginação fértil (e afinal quem não lê romances deve ser muito estúpido!) e também faz pensar que talvez ela esteja menos a atirar pedras a Anne Redcliffe e mais a usar essa base para criar o seu próprio estilo literário.

Esta relação é muito desigual. Catherine e Henry têm oito anos de diferença, o que suponho que não fosse nada incomum, mas como ela é tão inexperiente o desnível fica logo evidente. Ela está sempre um passo atrás na conversa [de novo, relatable] Por sorte a nossa heroína tem um coração sem malícia e está pronta a aprender e Henry, que tem a mania que é engraçado, está mais do que contente por ter uma rapariga inculta a sorver tudo o que ele diz com admiração.

"She was to be their chosen visitor, she was to be for weeks under the same roof with the person whose society she mostly prized — and, in addition to all the rest, this roof was to be the roof of an abbey! Her passion for ancient edifices was next in degree to her passion for Henry Tilney." Não tenho moral para falar das minhas escolhas aos dezassete anos, mas talvez casasse mais depressa com um edifício antigo...

Não ficamos a saber se o pedido de casamento foi bonito porque Jane despacha esses shenanigans a alta velocidade no capítulo final o que me leva a concordar com uma das análises que encontrei: este não é o clímax da história, mas sim quando Catherine é forçada a sair de Northanger. Isto mostra que o maior interesse está no amadurecimento da personagem, algo que fica claro neste momento. Ainda que este livro seja menos desenvolvido e subtil que os seguintes (avaliação que eu devia fazer só no fim mas ok) os traços tão característicos dos romances da Austen já estão aqui presentes. 

Agora, avançando: o próximo título será Sensibilidade e Bom Senso. Este vai demorar um pouco mais porque é maior e está em inglês, além de que para não enjoar é melhor intercalar com outras leituras - parece que fiz de propósito ao escolher um livro da Shirley Jackson, mas foi coincidência.

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