Foi um ano bem complicado, eu sei. Mas agora é tempo de apreciar algumas das coisas incríveis que as mulheres fizeram a nível colectivo e individual. Janeiro veio mostrar que a união faz a força: no dia 21 milhões de pessoas participaram na Marcha das Mulheres contra o novo presidente e a favor da igualdade de género, da justiça social e da tolerância. Mais de 600 marchas em todos os continentes. Uma ideia que partiu de um grupo de mulheres comuns e que se tornou um dos maiores protestos da história americana, o maior jamais feito num único dia. Aqui neste cantinho organizaram-se protestos em Maio e Novembro contra a violência doméstica e a rape culture. A revista Time escolheu como pessoa do ano os Silence Breakers: um colectivo de pessoas, mulheres e homens, de diferentes cores e estatutos socioeconómicos que denunciaram casos de assédio e abuso. O dicionário Merriam-Webster elegeu feminismo como palavra do ano: os casos de assédio e séries e filmes como The Handmaid’s Tale e Wonder Woman contribuíram para que a pesquisa pela palavra aumentasse 70% face a 2016.
Em Julho na Tunísia fez-se história ao serem aprovadas medidas para proteger as mulheres contra a violência doméstica e o abuso sexual. Acontecimentos que colocaram a desigualdade de género no centro da discussão e que passaram uma mensagem forte: não temos de ficar caladas não importa quem seja o opressor. A nossa selecção feminina de futebol deu o seu melhor e mostrou que se deve investir no desporto não só nos homens. No resto do mundo as mulheres enfrentam os preconceitos para praticarem o que gostam, seja boxe em Cabo-Verde ou esgrima no Afeganistão.
Elas correm 800 metros grávidas com um top da Wonder Woman e a barriga à mostra e correm 7 horas de saia e sandálias. A Alemanha tem agora uma mulher a arbitrar jogos de futebol da liga principal. Na Austrália a senadora Larissa Waters tornou-se a primeira mulher a amamentar na sala do parlamento. Até ao ano passado isso era proibido e as mães tinham que sair da sala. Arranjam maneiras criativas de alimentar quem precisa e salvam meninas de redes de tráfico. Vão ao espaço, não importa a idade. Ganham prémios com filmes sobre outras mulheres que também desafiaram a sociedade. A militar Noémie Freire é a primeira mulheradmitida no curso de submarinista da Marinha portuguesa.
Yusra Mardini vivia em Damasco e costumava representar o seu país em campeonatos de natação, mas com a guerra as coisas mudaram: tinha de treinar em piscinas com telhados esburacados por bombas e uma acabou por atingir a sua casa. Ela e a irmã tiveram que fugir para a Turquia onde apanharam um bote em direcção à Europa. A frágil embarcação só devia levar 7 pessoas, mas levava quase 20. Quando o motor parou e o bote começou a fundar Yusra, a irmã e mais 2 pessoa, as únicas que sabiam nadar, saltaram para as águas geladas do Egeu e durante mais de 3 horas puxaram o bote em segurança até terra. Yusra foi da Grécia até à Alemanha onde continuou a treinar. Em 2016 foi incluída na equipa de refugiados que competiu nos Jogos Olímpicos e este ano tornou-se a mais jovem embaixadora da boa vontade da história do ACNUR. “The most important thing in my life is swimming. Then speaking and doing things to help refugees”
O facto de ter Síndrome de Down nunca impediu Collette Divitto de levar uma vida activa: formou-se na universidade, fez voluntariado, jogou golfe e na adolescência ganhou gosto por pastelaria. Mas quando tentou encontrar trabalho tudo o que ouviu foram nãos: "many people who interviewed me for jobs said I was really nice but not a good fit for them". Então com o apoio da família ela decidiu abrir o seu próprio negócio - a Collettey's Cookies, com uma receita criada por si. No início recebia pedidos para 100 bolachas por semana, mas depois que um canal de televisão divulgou a sua história os pedidos chegaram a 25.000 por todo o país, incluindo um da organização dos Óscares. Agora o seu objectivo é conseguir instalações que lhe permitam expandir o negócio e contratar pessoas com deficiência
Na primeira classe Kheris Rogers era uma das únicas 4 crianças negras da turma e começou a sofrer bullying. Mesmo depois de se mudar para uma escola mais diversa o tom escuro da sua pele continuou a ser alvo de gozo e não era fácil para ela fazer amigos. Quando a sua irmã mais velha viu o quão triste Kheris estava, começou a postar fotos dela no Twitter com a hashtag FlexinInHerComplexion. O post tornou-se viral e inspirou Kheris a criar a sua própria linha de roupa infanto-juvenil usando a frase Flexin in my Complexion [algo como Força na minha Cor] como nome de marca. Ela apresentou a sua colecção na semana da moda em Nova York e com apenas 11 anos tornou-se a estilista mais nova que já participou no evento. Tem mais de 55 mil seguidores no Instagram e pretende continuar a inspirar outras pessoas a amarem a sua pele
Uma notícia que tinha de ser assinalada: faleceu ontem aos 105 anos Manuela de Azevedo, a primeira jornalista mulher a ter carteira profissional em Portugal e que era também a mais antiga repórter do mundo! Nascida a 31 de Agosto de 1911, em Lisboa, trabalhou em jornais como o Século, o República e o Diário de Notícias. Em 1930 quando entrou para o República quiserem criar uma secção especial só para ela - a Tribuna da Mulher. Recusou logo: "era só o que faltava, nem tribunas de homens nem de mulheres, ali havia jornalistas". Em 1946 disfarçou-se de criada para conseguir chegar ao rei Humberto II de Itália que estava exilado em Sintra. Uma das muitas personalidades que entrevistou. Durante uma conferência da NATO perguntou "se eles conheciam a democracia orgânica com que Salazar pretendia fugir à definição da palavra democracia" - uma peça de teatro sua e um artigo sobre a eutanásia foram censurados pelo regime. Também escreveu romances, ensaios e poesia e fundou uma casa dedicada a Camões em Constância. Em 2010 foi lançada esta biografia - gostei muito e recomendo a quem quiser conhecer a história tão rica desta mulher."O jornalismo não é só aquele que diz que morreram tantas pessoas num desastre. O jornalismo é o defensor da objectividade, de focos, de problemas sociais."
Fazer resumos de 2016 pode ser deprimente, mas não no que às mulheres diz respeito. Para começar a lista 17 Badass Women You Probably Didn’t Hear About In 2016 - inclui as centenas de mulheres que protestaram na Islândia contra a diferença de salários entre homens e mulheres, as raparigas que desafiam a proibição de andar de bicicleta em Gaza e as Las Hijas de Violencia que cada vez que são assediadas na rua disparam confetis na direcção do agressor. Em Fevereiro Leonor Teles tornou-se a mais jovem realizadora de sempre a ganhar um Urso de Ouro com a sua Balada de um Batráquio. E a nível de cinema não foi só isso. Em Março uma mulher foi pela primeira vez escolhida como assessora militar da Presidência da República: a tenente-coronel Diná Azevedo tem um currículo de respeito que inclui ter sido a primeira mulher a comandar uma esquadra da Força Aérea. Em Maio 300 mulheres juntaram-se em Jerusalém para protestar contra o violência e o assédio sexual.
Em Outubro a nossa selecção feminina de futebol apurou-se pela primeira vez para um Campeonato Europeu. Mais cedo neste mês Nadia Murad e Lamiya Aji Bashar receberam o Prémio Sakharov de Liberdade de Pensamento do Parlamento Europeu. E uma menção tem de ser feita às Senhoras da Força do Sol um grupo de 123 mulheres Yazidi que conseguiram fugir ao Daesh e que agora formam uma brigada de combate exclusivamente feminina. Elas estão nas linhas da frente dos combates no Iraque e participaram activamente na reconquista das montanhas Sinjar o ano passado. Noutro palco de conflito mulheres usam a música para denunciar a violência sexual. chegamos a todas as áreas: empresas, tecnologia, mudar o futuro das crianças, fazer os outros rir, lidar com regras sem sentido...
Muskaan Ahirwar vive num bairro pobre da Índia, onde muitas crianças não têm acesso à escola. Foi a pensar nelas que esta menina de 9 anos decidiu organizar uma biblioteca no exterior da sua casa. Todos os dias depois de chegar da escola à tarde ela abre a biblioteca perante dezenas de crianças que aguardam ansiosas - todos são incentivados a levar livros ou a sentarem-se para ouvirem Muskaan ler as histórias. Todo o trabalho é feito por ela com ajuda da irmã mais velha, com tal sucesso que a biblioteca já foi reconhecida como oficial com direito a placa e tudo e já há planos para adquirir mais livros pois os 119 disponíveis já foram quase todos lidos.
Depois de notar vários sem abrigo no seu caminho para a escola Khloe Thompson de 9 anos pensou que tinha de fazer algo: ela criou um projecto chamado Khloe Kares em que com a ajuda da mãe e da avó organiza packs de produtos de higiene que depois distribui pelas mulheres sem abrigo da sua comunidade. Os sacos não são de plástico, mas de pano e ela própria costura. O seu próximo passo é conseguir dinheiro para transformar o Khloe Kares uma organização de caridade e também para comprar brinquedos para dar às crianças que vivem em casas de acolhimento.
Quando Theresa Kachindamoto deixou o seu trabalho de secretária para ir ocupar o lugar de chefe em Dedza no centro do Malawi deparou-se com uma realidade chocante. O Malawi tem uma das taxas de casamento infantil mais altas do mundo (mais de metade das raparigas estão casadas antes de fazerem 18 anos), além de existirem práticas tradicionais de violência sexual. Ela reuniu os seus 50 sub-chefes e obrigou-os a assinar um documento para acabarem com o casamento infantil naquela área. Também os obrigou a anular qualquer união dessas e a mandar as crianças para a escola. Os que não cumpriram o acordado foram logo suspensos. Theresa também tenta falar com a população sobre o valor da educação e tenta arranjar quem possa pagar as despesas escolares das crianças mais pobres, quando não é ela mesmo a fazê-lo. Nos últimos três anos, e mesmo recebendo ameaças de morte, ela conseguiu anular quase 850 casamentos infantis. Todas as crianças envolvidas voltaram à escola.
Maia Dua é uma estudante de 16 anos, de West Sacramento na Califórnia, que construiu um robot destinado a ajudar pessoas invisuais. Sensores usam a ecolocalização para detectar os obstáculos no caminho e um sinal sonoro é enviado para o utilizador. Feito com materiais baratos, o Seeing Eye-Bot foi projectado para ter um custo à volta dos 500 euros (muito menos que o custo de um cão guia) e uma duração de 7 anos. Este projecto foi submetido a um concurso da Marvel (destinado a raparigas com projectos na área da matemática, ciência e engenharia) e ficou em primeiro lugar entre cerca de mil candidaturas. E ela só soube do concurso quatro dias antes de acabar o prazo. Além de ser apaixonada por engenharia Maia também é praticante de wrestling.
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