Esses objectos especiais
Cada vez que tenho de limpar a minha estante ocorrem-me certos pensamentos: o primeiro é quando vejo que alguns dos meus livros estão a ficar velhinhos. É como as pessoas: começam a ficar enrugados e com manchas e não há muito que eu posso fazer. No sentido mais prático, mostra o quanto as editoras se preocupam ou não com os livros que colocam à venda: tenho alguns cujo papel é um autêntico sugador de pó enquanto em outros ele se mantém branco. Penso na tristeza que é no futuro ninguém ter estantes com livros - e até sinto um arrepio. Por mais que goste de livros digitais e ache prático, não quero uma estante ou listagem digital. É certo que uma estante ocupa espaço, os livros envelhecem, ficam com um cheiro esquisito, pessoas podem entrar agora em vossa casa e pegar-lhes fogo...Mas isso também não é diferente do que acontece com os seres humanos. Sejamos salvos da total frieza antisséptica. Penso que devia empilhar os livros no chão e não no cimo da estante evitando uma potencial morte e no quanto uma estante pode ser um álbum da vida do seu possuidor - pega-se neste ou naquele livro e pensa-se: "que quente foi aquele verão", "sinto falta desta pessoa" ou "que discussão ridícula que tivemos naquele dia". Nada disso relacionado com a história em si. Algumas memórias podem ser embaraçosas, mas a menos que as contem a alguém elas continuarão guardadas na privacidade das páginas do livro. Podem pegar nele e lê-lo de novo, acrescentado novas camadas de memória ou podem deixá-lo quietinho durante anos que quando voltarem a abrir elas estarão lá. Não sei o que faz com que os livros tenham esta capacidade de cristalizar um momento, como uma foto com conversas, música e sensações incluídas. Mas é algo muito bonito.