Coisas que vivem na estante - I
(Detalhe da colecção - "a leitora tem um lado masoquista")
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(Detalhe da colecção - "a leitora tem um lado masoquista")
Fez no dia 21, mas por alguma razão o meu cérebro acha sempre que é dia 26 e pensei que esse dia tivesse sido ontem mas afinal hoje é que é 26. Estou a ficar velha de facto: quando abri isto tinha 19 anos e se isto fosse um canal eu iria presentear-vos com um daqueles vídeos em que a pessoa no presente reage a coisas que gravou no início...Ia ser um fartote, mas como isto é escrita fico a salvo de momentos embaraçosos. Ir aos posts iniciais já é quase arqueologia. Mas foi bom ter aberto o blog nessa altura porque quando era teen eu era um bocado ácida. Anyway, chegou aquela parte para agradecer, porque é mais que justo: a todos os que visitam, comentam e gostam e ao Sapinho que vai destacando os posts. Muito obrigado! Um beijinho para todos
Num post anterior contei que estava a planear que pelo menos seis das minhas próximas leituras fossem de autoras. Acabei por ler dez - todas pela primeira vez. Somos capazes de escrever bem em qualquer género. Se o reconhecimento é menor não é por falta de talento, mas por outros motivos que se tornam ainda mais evidentes quando se começa a pesquisar e se constata o número de autoras que quase não existem no mercado e das quais raramente se ouve falar. Fiz uma lista das escritoras que li:
1. Delta de Vénus, Anaïs Nin: conjunto de contos eróticos escritos durante os anos 40. Se um leitor não ficar espantado por uma mulher escrever sem tabus sobre sexo naquela altura ou por até então não haver precedentes de material erótico escrito do ponto de vista feminino vai ficar quando começar a ler e descobrir que este livro é tão bom que ultrapassa qualquer ideia que possa ter à partida.
2. Girl, Interrupted, Susanna Kaysen: memórias do tempo que a autora passou internada num hospital psiquiátrico em 1967 quando tinha 18 anos. Não é nenhum Bell Jar, mas é interessante e mostra bem como é ténue a linha que separa uma mente considerada saudável de uma que não é.
3. O Exílio, Pearl S.Buck: biografia da mãe de Pearl Caroline Stulting, desde a sua infância na Virgínia até à sua vida na china como mulher de um missionário presbiteriano. Dito assim parece frio, mas não é: a autora mostra-nos com uma escrita sublime as nuances do carácter de Carrie: a sua força perante tragédias, a sua capacidade de se adaptar a um sítio muitas vezes hostil, a sua sensibilidade perante o sofrimento dos outros e perante a natureza - que muitas vezes chocava com o seu lado religioso mais austero. Devo admitir: as últimas linhas foram lidas com lágrimas.
4. A Assombração da Casa da Colina, Shirley Jackson: nascida em 1916 na Califórnia a autora ficou conhecida pelos seus trabalhos de mistério e horror. The Haunting of Hill House publicado em 1959 é sobre quatro pessoas que se juntam para investigar misteriosas ocorrências numa mansão. É tudo o que uma obra destas deve ser em termos de escrita, construção narrativa e suspense. É considerada uma das melhores ghost stories do século XX.
5. O talentoso Mr. Ripley, Patricia Highsmith: Tom Ripley é um tímido e pacato jovem que sobrevive na selva urbana de Nova York até que um estranho pedido o coloca na direcção das belas praias da Sicília...Onde coisas irão começar a suceder. Clássico da literatura policial recheado de humor negro.
6. Intérprete de Males, Jhumpa Lahiri: autora americana filha de pais indianos que em 2000 ganhou o prémio Pulitzer de ficção com este mesmo livro. Um conjunto de contos em que partindo de situações por vezes tão simples como um corte de electricidade ou a compra de peixe fresco, Lahiri desenvolve com sobriedade e sem floreados os temas da integração e do multiculturalismo.
7. O Amante, Marguerite Duras: considerado autobiográfico é a história de uma rapariga de 15 anos que se envolve com um magnata chinês mais velho, em Saigon nos anos 30. É também uma história sobre famílias complicadas, vida colonial e envelhecimentos precoces. Uma experiência íntima de auto-reflexão escrita de um modo que nos faz sentir como se estivéssemos a flutuar.
8. Sombras Queimadas, Kamila Shamsie: narrativa épica que começa em 1945 no Japão, passa pela divisão entre a Índia e o Paquistão e termina no 11 de Setembro. Muitas questões pertinentes para os dias de hoje, escrita fluida e cuidada e personagens bem desenvolvidas.
9. Meio Sol Amarelo, Chimamanda Ngozi Adichie: história de amor e coragem que tem como pano de fundo o período desde o nascimento do Biafra em 1967 até à sua morte em 1970 depois da guerra com a Nigéria. Uma catástrofe com mais de 2 milhões de mortos. Achei o tema interessante, mas não gostei muito do livro em si.
10. O Papel de Parede Amarelo, Charlotte Perkins Gilman: nascida em 1860 no Connecticut Gilman foi uma proeminente feminista, socióloga e escritora. The Yellow Wallpaper (1891) é sobre uma mulher que sofre de depressão e que, proibida de fazer qualquer actividade, vai ficando obcecada com o papel de parede do quarto. Numa primeira leitura um bom conto de mistério\terror, mas nas entrelinhas uma acutilante crítica à opressão sobre as mulheres: a infantilização; o confinamento exclusivo ao lar que prejudica a sua saúde mental e a sua redução a um mero instrumento reprodutor. Apetece-me imprimir este livro e distribuí-lo por toda a gente.
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