Malvina e as Injustiças
Há umas semanas acabei de ler a Gabriela do Jorge Amado: narrativa passada nos Ilhéus nos anos vinte, cheia de momentos deliciosos e memoráveis e de personagens também elas memoráveis. Ora, lá pelo meio há um moço poeta que está apaixonado por uma senhorita, um belo e puro sentimento, e então eles começam a falar e tal mas a senhorita rapidamente percebe que eles não comungam das mesmas ideias especialmente quando ele lhe dá "sugestões" sobre como se deve comportar. Então ela decide rumar para outra costa e ele fica magoado e desata escrever poemas sobre como se apaixonou por uma criatura vil. A seguir começa a escrever inflamados textos sobre como são vis as senhoras da sociedade brasileira e termina a insultar todas - do mundo, senhoritas ou trabalhadoras. Além de andar com cara de enterro, comovendo toda a gente. Achei hilário porque encaixa tão bem nesses cavalheiros das interwebs que fazem comentários impróprios porque foram traídos por uma namorada. Um clássico, pelos vistos imutável. A verdade é que eu nunca consegui perceber de onde vem a ideia de que um género é mais racional e lógico do que o outro...Não vejo em que evidências isso se baseia. Quem nasce com um pénis é um pilar de seriedade e quem nasce com um pipi é uma confusão histérica e pouco confiável? Bullshit.
Já era hora de deixarmos isto de as características de cada um serem definidas pelo que está entre as pernas. Não quero ter de ser doce, meiga, paciente, virtuosa....Quer dizer, não dá para ser isso tudo a toda a hora. O contrário também é válido: "eu sou rapaz, mas gosto desta música da Taylor" - às vezes no Youtube parecem estes comentários, mas não há mal nenhum: comam magnus pink, vejam a Anatomia de Grey ou leiam boas romançadas...Vão à varanda cantar: I don't know about you, but I'm feeling 22, everything will be alright if you keep me next to you!! É estranho que quando três ou quatro senhoras se zangaram num programa televisivo eu tenha encontrado um texto a questionar se as mulheres eram aptas a participar em debates mas nunca tenha encontrado o mesmo tipo de interrogação quando deputados partem cadeiras nas cabeças uns dos outros. Nem nunca vi pessoas sentarem-se para discutir se o sistema hormonal de um candidato a presidente pode ser um problema. Também não me lembro de ouvir muitas vezes dizer - "deixa a tua filha namorar à vontade, está na idade." E presumo que a percentagem de vezes que se diz "esquece, ele estava zangado, tem paciência" e "esquece, ela estava irritada, tens de ter paciência" não seja a mesma. Antes de pertencermos a um género, todos nós, não somos primeiro humanos? Devia ser...E agora vamos lá: Everything will be alright if we just keep dancing like we're... 22, 22!!