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Desabafos Agridoces

"Enfim, bonito e estranho, desconfio que bonito porque estranho"

Desabafos Agridoces

"Enfim, bonito e estranho, desconfio que bonito porque estranho"

Leituras: pipis por todo o lado

Já terminei Lolly Willowes de Sylvia Townsend Warner. A história começa quando a nossa protagonista, Laura - uma solteirona à proveta idade de 28 anos - vai viver para casa do irmão em Londres. Até aí ela tinha levado uma vida pacífica no campo com o seu pai, lendo livros considerados impróprios para moças, colhendo plantas e fazendo destilações com elas, não mostrando interesse em ir a festas onde poderia arranjar marido - desconsiderando assim o dever de toda a mulher jovem e casadoira de ser charmosa. Quando o seu pai morre não ocorre a ninguém perguntar-lhe o que ela deseja - é esperado que ela fique contente com o quartinho que lhe dão e que se torne útil. Rapidamente ela perde a sua identidade, deixando de ser Laura para passar a ser a tia Lolly...Não pode ir a lado nenhum nem fazer o quer e nunca consegue estar sozinha, absorvida pela rotina da família. 

Até que um dia para espanto de todos ela anuncia que vai sair de Londres para ir viver sozinha numa pequena aldeia no campo. Publicado em 1926 Lolly Willowes além da incorparação de elementos de fantasia, advogava que as mulheres tinham o direito de ser independantes e de terem um sítio só para si, três anos antes de o A Room of One's OwnQuando começou a escrever este romance, Sylvia tinha vinte e nove anos e nenhum marido. Vivia num pequeno apartamento na capital e trabalhava numa editora, também tinha começado a escrever e a publicar poesia.

 

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Uma vida um pouco menos confinada do que a vida da sua personagem, nascida vinte anos antes. Ao longo da sua carreira (faleceu em 1978) ela publicou mais cinco romances, vários livros de poesia e contos, traduções e biografias. Era activa no partido comunista, serviu na Cruz Vermelha durante a Guerra Civil Espanhola, e durante quatro décadas manteve uma relação com uma mulher. 

Mais um nome para a lista de autoras que me eram absolutas desconhecidas, onde estão por exemplo May Sinclair (Life and Death of Harriett Frean) e Mary Bright (Keynotes). Entretanto comecei o livro que estava na mesa de cabeceira e que mostrei num post anterior. Muitas saudades tinha esta que vos escreve de coisas como esta que diz o protagonista referindo-se à mulher por quem está apaixonado: "Que infelicidade a sua, não poder aspirar a possuir aquela criatura ideal!" Alguns pessoas dariam um desconto já que foi escrito em 1882, já eu acho que os homens são estranhos.

Não sei o que o autor acharia de estar encaixado entre livros que falam de bruxas e outras mulheres não ideais (felizmente) e genitália feminina. Às vezes as leituras alinham-se:

 

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Pois a seguir estou a pensar ler Period. End of Sentence. A New Chapter in the Fight for Menstrual Justice, de Anita Diamant (autora do livro The Red Tent). A Origem do Mundo (Uma História Cultural da Vagina ou a Vulva Vs. O Patriarcado) de Liv Strömquist, não ficou muito visível na foto, foi um achado e não me parece que vá passar muito tempo até o ler. Pode parecer que isto são livros que chegue envolvendo pipis, tendo em conta que no fim do ano passado li O Prazer da María Hesse, mas devo ter mais uns dois livros sobre este assunto. Nunca são demais.

Deuses e Heróis

Provavelmente já falei disto: ao ler autoras deparo-me com um grande número de histórias em que as mulheres são as protagonistas. Não é obrigatório claro, mas faz-me lembrar um artigo que dizia haver uma relação entre mais mulheres realizadoras e mais filmes com protagonistas femininas e histórias focadas em mulheres. Do que tenho lido estes anos (e mesmo pelos ainda poucos filmes que vi), esta relação sem dúvida existe. Há muita gente que se acha para a frente porque diz que não vê raça ou género...Mas isso na verdade é uma cegueira, pois implica passar por cima das desigualdades que nos rodeiam. Também não acho que as mulheres escrevam todas de uma certa maneira...

 

Tenho lido muita coisa diferente e tenho lido também histórias que versam sobre a vida das mulheres dentro do casamento e a sua relação com os homens (poderia arranjar uma editora eu própria se recebesse um euro cada vez que leio algo escrito por uma autora classificado como ficção doméstica...), não é como se os homens fossem empurrados para fora do cenário, mas é interessante como a "câmara" muda de foco criando um contraste com a literatura clássica masculina...É possível que nem todos gostem de um retrato mais honesto, em comparação com os clássicos que os apresentam como deuses, heróis ou trágicos monarcas, pensando nisso não admira que muitos se vejam dessa forma...

 

Mas os senhores têm sorte pois podem escolher não ler escritoras porque a nossa experiência é acessória enquanto eu cresci com este tipo de personagens porque a experiência deles é essencial e é o que tem de se ler. Serem os salvadores do pedaço é outro papel que desde os primórdios os homens encarnam - pensamos na questão do salvador branco, por exemplo. É triste pensar que só muito recentemente comecei a pensar a sério neste aspecto que no entanto é tão comum em livros [sim, não vamos fingir que não estamos a pensar em livros como Não Matem a Cotovia] e filmes. E no entanto basta desviar só um pouco a câmara.

 

"In most cases, white savior come out as the good guy. They come out when the audiences are fed up with all the misery and injustice minority characters suffered through the story. The minorities need saving, and we the audience need to see justice done, we need to be told that the world is fair, and good people get to be winners. But more importantly, white savior trope serves a on-screen audiences avatar for the white audiences.

 

The trope separate white people into two groups: The bad white people who oppress the minorities, and the good white people who save the minorities. Once the story adds a white savior, the story has ceased to be a story about minority struggle to raise up against all odds, instead it becomes a story about good white people struggle against bad white people."

 

(Citação tirada daqui)

 

Basicamente é uma forma de darmos palmadinhas nas costas e é tentador enquanto mulheres brancas também assumirmos este complexo quando, por exemplo, olhamos para as outras mulheres que vivem em diferentes culturas: coitadas, tão pobres, submissas e iletradas...Por vezes a experiência feminina conecta-se de uma maneira que arrepia: pode não parecer muito provável que três autoras completamente diferentes descrevam a mesma experiência de ter de sorrir e fazer conversa por puro terror de não serem mortas. Mas é verdade.

 

Na minha leitura actual quando a personagem pega numa revista feminina e lê que para salvar o seu casamento tem de analisar todos os seus gestos, expressões e palavras para perceber o que é que ela está a fazer de errado vejo que seja em Corroios seja no Gabão, estas revistas são um autêntico lixo. Ao mesmo tempo cada experiência tem as suas nuances e questões e todas têm direito a voz.

 

Livros da Svetlana

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"The Chronicle of the Big Utopia"

 

A Guerra não Tem Rosto de Mulher, 1985 (lido mas sem ser em papel,

guarda na estante para ser relido em papel)

As Últimas Testemunhas, 1985 (lido)

Rapazes de Zinco, 1991 (não lido, falta comprar)

Enchanted with Death, 1993 (não lido, não tem tradução)

Vozes de Chernobyl , 1997 (lido)

O Fim do Homem Soviético, 2013 (não lido, na estante)

 

Quem Escreve Aqui

Feminista * plus size * comenta uma variedade de assuntos e acha que tem gracinha * interesse particular em livros, História, doces e recentemente em filmes * talento: saber muitas músicas da Taylor Swift de cor * alergia ao pó e a fascistas * Blogger há mais de uma década * às vezes usa vernáculo * toda a gente é bem-vinda, menos se vierem aqui promover ódio e insultar, esses comentários serão eliminados * obrigada pela visita!

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