Diversidade: porque é tão importante
Não é irónico que os estúdios se esfalfem tanto para fazer filmes com super-heróis masculinos e brancos quando no fim do dia as produções mais cotadas e com mais sucesso parecem ser aquelas cujos protagonistas não se encaixam nessa categoria? Claro que para algumas pessoas pensar nisso é motivo para espumar da boca: coisa "nociva", "politicamente correcta" e "uma forma de sexismo (ou racismo) ao contrário". E também há os que dizem que tudo isto não tem qualquer importância. Fico contente por quem acha que a diversidade é uma coisa de somenos. Com certeza são pessoas que se sentem representadas quando vão ao cinema ou ligam a televisão...
Cada vez que uma mulher tem o papel principal, cada vez que um realizador negro recebe um prémio, cada vez que uma modelo amputada ou tamanho 44 é capa de revista - isso é um tijolo colocado na construção da auto-estima de muita gente, especialmente crianças. Algures o ano passado encontrei este relato num site: uma menina depois de ver um certo filme decidiu que queria ir sempre para a escola vestida como a personagem. Quando lhe disseram que ir assim vestida todos os dias não podia ser, ela disse que era preciso porque podia precisar de salvar o mundo a qualquer momento. Quantas oportunidades as meninas têm para se sentirem assim? Nós gostamos de nos sentir valorizados certo? então porque não estender esse sentimento a todos neste mundo? A rapidez com que as crianças interiorizam a inferioridade: ainda nem perderam os dentes de leite e já aceitaram que a sua cor é feia e que as mulheres não podem fazer o papel de guerreiras...
Recuperando uma metáfora já usada aqui e que se aplica muito bem: a diversidade só é nociva para quem pensa nela como uma tarte: se alguém tirar uma fatia eu vou ficar com menos. "Só 97% dos filmes terem como personagens centrais homens brancos enquanto o ano passado eram 98%?!! Não é isso um complô armado pelo paradigma social para me retirar os meus direitos?" Não. Dizer-se que a diversidade é racismo (ou sexismo) ao contrário é usar um argumento utópico. É como cantarem sobre o quão maravilhoso é este mundo enquanto tentam passar por uma pilha de corpos no chão. Outra coisa engraçada que encontrei algures: alguém indignado porque uma actriz publicou uma foto de uma camerawoman que estava a trabalhar naquela produção - por quê destacar o trabalho dessa pessoa só por ser mulher? Resposta - vou deixar de fazer isso quando as mulheres passarem a ganhar o mesmo. Touché. Não seria necessário destacar o trabalho feminino se ele fosse valorizado. Se todos os seres humanos fossem tratados como iguais e não como seres de segunda ou como objectos. E se todos tivessem as mesmas oportunidades. "Quê? O paradigma social já não conseguiu que mulheres e afins tivessem mais direitos?" A resposta também é não.
Para que se vai criar um mês para celebrar as conquistas masculinas (brancas), se isso acontece todos os dias do ano e basta abrir um manual de História - estão lá detalhadas com toda a glória...Subtraindo até alguns factos interessantes, por exemplo: como é que na realidade os impérios são construídos. À sombra de corpos enforcados e sobre os corpos de Judites inertes. Quando falei aqui da ideia de ler mais autoras alguém questionou: "mas ser feminista não é querer igualdade de género?" Como se eu estivesse a ser sexista por escolher ler mulheres, quando nós nunca tivemos igual oportunidade de estudar, publicar e ter uma carreira literária (ou outra). É uma questão de justiça - estas histórias escritas por mulheres são tão dignas de atenção atenção como as escritas por homens. Da mesma forma se eu for ver um filme sobre Marie Curie, Bessie Coleman ou Nancy Wake (nunca se sabe...), não estou a dizer que acho uns superiores aos outros na ciência, na aviação ou na espionagem, mas sim: a experiência destas mulheres é digna e merecedora de ser contada, em vez de ser enterrada ou apagada. Quando a diversidade aumenta todos são beneficiados.