Mulher
Honoré Dumier A lavadeira
Hoje lembrei-me de ti
E da tua luta para viver
Que todos desprezam
Levantas-te quando ainda não se apagaram as estrelas
Andas pelos caminhos empoeirados
O céu conhece o teu destino
Quando te escondes na sombra
Vergas as costas ao sol que te há-de queimar
E o rosto à terra crestada
Que não te dá descanso
E que há-de tragar todas as tuas forças
Tens a pele tisnada pelo calor
As mãos calejadas
Os olhos mortos e vazios
És um corpo que apodrece escondido
O chão conhece os teus passos
Carregas os teus proventos à cabeça
Tens o mundo agarrado às saias a pedir pão
E já carregas outro no ventre condenado à mesma sorte
Mas algo que não te podem tirar
É a esperança que trazes na alma reprimida
Nas covas que são os teus olhos
E que acalentas todos os dias
Quem te pode abafar os sonhos?
As tuas lágrimas não se vêem
Quem pode saber que desejas a liberdade
Quando não passas de um vulto?
E há-de chegar o dia para soltares esse grito sufocado
Porque estás grávida não dos filhos que te fazem à força
Mas de sonhos de vida
Que dás à luz nesse caminhos de morte
A noite fria desce como um véu
A lua guia-te na escuridão
Amanhã será mais um dia de luta
Nesse corpo de mulher que deus te deu
Sara