O queijo
Como é sabido os currículos escolares incluem a leitura de certas obras de autores portugueses. Ora, isto de por os alunos a ler Camões, Saramago, Pessoa, etc…é muito bonito. Era ainda mais bonito se a obras fossem, de facto, lidas. 90% (com algum optimismo) dos jovens nunca chegam a pegar em obra nenhuma, safam-se com aqueles horrorosos livrinhos de capa amarela, ou pior ainda: apontamentos sacados a alguém na véspera dos testes. Safam-se, porque a análise das obras nas aulas é tão superficial, que minimamente bem feitos, esses apontamentos chegam. Parece que ninguém está preocupado em saber por é que é os ditos livros não são lidos, nem com o facto de os alunos entrarem (e saírem) das faculdades tão ignorantes culturalmente. Sinceramente, não se pode esperar que alguém que nunca leu nada na vida, vá ficar extasiado com Os Maias.
Este é um país onde há quase um milhão de analfabetos (Fonte: notícia do Público), por isso o problema é estrutural. É preciso ler para os meninos e meninas logo desde pequeninos; não é só ensiná-los a juntar as letrinhas, é preciso colocar livros adequados à sua disposição. Olha que outra coisa tão bonita de se dizer…O problema é que em casa também devia haver estímulo e parece-me que isto é um círculo vicioso: se os pais não tiverem hábitos de leitura a criança terá dificuldade em adquiri-los (à excepções evidentemente). Não sei até que ponto se pode sensibilizar os pais: como é que se diz a uns pais que tem de lutar para por comer na mesa que devem comprar livros para os filhos? Neste país um livro é um objecto de luxo. E como é que se tem resolvido estes problemas? Qualquer dia distribuem exames com a folha de respostas junto, qualquer nem preciso às aulas ir (então aquele que se mata a estudar tem a mesma nota daquele que andou de papo pró ar e no fim fez um exame? Nada porreiro pá…). É numa geração hipotecada… a hipotecar a próxima.
Voltando aos livros: parece-me que os programas também não ajudam. Então, num ano dão-se duas obras, no ano a seguir não se dá nenhuma e no outro dão-se três? Estes programas não estão adaptados aos alunos, a sua utilidade, em alguns casos, também é discutível. Quantidade não é sinónimo de qualidade. Quanto mais se tenta açambarcar pior: se não lermos as obras, não é nas aulas que vamos ficar a conhece-las, porque é tudo dado sempre à pressa. Às vezes não parecem aulas, parecem corridas de obstáculos…azar para os que caem. Não há espaço para o essencial: desenvolver o pensamento, tira-lo os alunos da sala, mostrar outras coisas (é preciso cumprir o programa, qual senhor déspota e feroz); é só enfardar matéria e siga (ah povo individualista, abúlico e destituído de espírito crítico! Já dizia o outro…). Nem perguntam aos petizes por que não gostaram daquilo…devo dizer que não sou boa pessoa para discutir se os Maias é uma obra chata, porque sou apaixonada por Eça (é tão divertido!), a única coisa que não gostei assim por ali além foi O Frei Luís de Sousa, que achei entediante. Porque não há uma adaptação, consoante as necessidades específicas das pessoas? Já me esquecia, são 35 alunos por turma…
Penso que isto não vai lá com operações de cosmética, pensando bem em Portugal não se deveria chamar ensino, mas antes queijo suíço, se bem que não tarda nada é queijo fundido (nada de trocadilhos fáceis, vá…).